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STJ: verbas remuneratórias reconhecidas pela Justiça do Trabalho não podem ser incluídas na previdência complementar

Em 28 de outubro, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou o Tema nº 1.021 através dos Recursos Especiais Representativos de Controvérsia nº Recursos Especiais nº. REsp 1.740.397/RS e REsp 1.778.938/SP.

A questão submetida a julgamento consistia na “possibilidade de inclusão no cálculo da complementação de aposentadoria, paga por entidade fechada de previdência privada, de verbas remuneratórias incorporadas ao salário do trabalhador por decisão da Justiça do Trabalho, após a concessão do benefício, sem a prévia formação da correspondente reserva matemática”.

Confira-se o conteúdo das teses fixadas, propostas pelo Ministro Relator Antônio Carlos Ferreira e acompanhadas pelos demais Ministros, com ressalva do Ministro Raul Araújo:

(a) A concessão do benefício de previdência complementar tem como pressuposto a prévia formação de reserva matemática, de forma a evitar o desequilíbrio atuarial dos planos. Em tais condições, quando já concedido o benefício de complementação de aposentadoria por entidade fechada de previdência privada, é inviável a inclusão dos reflexos de quaisquer verbas remuneratórias reconhecidas pela Justiça do Trabalho nos cálculos da renda mensal inicial dos benefícios de complementação de aposentadoria; (grifou-se)

(b) Os eventuais prejuízos causados ao participante ou ao assistido que não puderam contribuir ao fundo na época apropriada ante o ato ilícito do empregador poderão ser reparados por meio de ação judicial a ser proposta contra a empresa ex-empregadora na Justiça do Trabalho;

(c) Modulação de efeitos (CPC/15): nas demandas ajuizadas na Justiça Comum até 8 de agosto de 2018, data do julgamento do REsp 1.312.736, e ainda sendo útil ao participante ou assistido, conforme as peculiaridades da causa, admite-se a inclusão dos reflexos de verbas remuneratórias, reconhecidas pela Justiça do Trabalho, nos cálculos da renda mensal inicial dos benefícios de complementação de aposentadoria, condicionada à previsão regulamentar de que as parcelas de natureza remuneratória devam compor a base do cálculo das contribuições a serem recolhidas e servir de parâmetro para o cômputo da renda mensal inicial do benefício, e à recomposição prévia e integral das reservas matemáticas com o aporte, a ser vertido pelo participante, de valor a ser apurado por estudo técnico atuarial em cada caso;

(d) Nas reclamações trabalhistas em que o ex-empregador tiver sido condenado a recompor a reserva matemática, e sendo inviável a revisão da renda mensal inicial da aposentadoria complementar, os valores correspondentes a tal recomposição devem ser entregues ao participante ou assistido a título de reparação, evitando-se, igualmente, o enriquecimento sem causa do ente fechado de previdência complementar.

O julgamento, portanto, define pela impossibilidade de repercussão de qualquer verba deferida em reclamação trabalhista no cálculo do benefício de aposentadoria já concedido por entidade fechada de previdência complementar.

Houve a modulação dos efeitos da repercussão geral: as ações propostas na Justiça Comum até 08 de agosto de 2018 poderão determinar a inclusão dos reflexos das verbas remuneratórias, com dois condicionantes: (i) a existência de previsão regulamentar; e (ii) a prévia recomposição da reserva matemática, a ser vertida pelo participante, de valor a ser apurado por estudo técnico atuarial.

Vale lembrar que no julgamento do Tema 955 a Segunda Seção do STJ já havia analisado a possibilidade de “inclusão, nos cálculos dos proventos de complementação de aposentadoria das horas extraordinárias habituais, incorporadas ao salário do participante de plano de previdência privada por decisão da justiça trabalhista”[1]  (grifou-se).

Na oportunidade, foi fixada tese em harmonia com os princípios balizadores do sistema de previdência complementar, estabelecendo ser inviável a inclusão dos reflexos das verbas remuneratórias (horas extras) reconhecidas pela Justiça do Trabalho nos cálculos da renda mensal inicial dos benefícios de complementação de aposentadoria, quando já concedido o benefício.

Contudo, como a tese fixada fazia menção à verba “horas extras”, a dúvida acerca da extensão do entendimento para as demais verbas remuneratórias subsistiu.

Por essa razão, a Segunda Seção do STJ, por maioria de votos, afetou os Recursos Especiais acima indicados sob o Tema 1.021, oportunidade em que o Ministro Relator sinalizou que “embora na fundamentação daquele julgado [Tema 955] tenha sido examinadade maneira geral, a possibilidade de revisão do valor da suplementação para incluir quaisquer verbas remuneratórias concedidas pela Justiça Trabalhista após a obtenção do benefício, o caso analisado tratou especificamente das horas extraordinárias” (grifou-se).

Confirmando nossas expectativas, o resultado do julgamento do Tema 1.021 espelhou o entendimento que já havia sido adotado no Tema 955, enaltecendo os princípios basilares do sistema de previdência complementar e evitando uma ruptura no custeio capitalizado derivada da concessão de benefícios sem prévias contribuições.

Sem dúvida, a consistente jurisprudência que vem sendo construída pelo STJ confere segurança jurídica às relações estabelecidas no âmbito da previdência complementar, protegendo participantes, assistidos e beneficiários.

Por fim, deve-se alertar aos empregadores-patrocinadores para a aferição dos “eventuais prejuízos causados ao participante ou ao assistido (…) [decorrentes do] ato ilícito do empregador [que] poderão ser reparados por meio de ação judicial a ser proposta contra a empresa ex-empregadora na Justiça do Trabalho”. A extensão desse ilícito terá aferição atuarial, que irá considerar as diferenças de complementações pelo tempo da expectativa de vida do participante e eventual beneficiário. Esse valor tende a superar a reparação trabalhista, que possui o limite temporal prescricional de 5 anos. Assim, é preciso ter atenção na apuração dos referidos prejuízos aos empregados-participantes.

Com a disponibilização da íntegra da decisão, voltaremos com uma análise mais detalhada.

Fernanda Rosa S. Milward Carneiro, sócia (frosa@bocater.com.br)

1. Acórdão publicado em 16 de agosto de 2018, nos autos do REsp 1.312.736/RS.

 

Autores

Fernanda Rosa S. Milward Carneiro

Área de atuação

Previdência Complementar e Investidores Institucionais

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