O Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de decisão do ministro presidente Luiz Fux de 13 de agosto de 2021, iniciou análise de repercussão geral sobre a competência da Justiça do Trabalho ou da Justiça comum em avaliar ações trabalhistas que buscam o reconhecimento de verbas e a inclusão delas nas contribuições para previdência complementar.
O Recurso Extraordinário nº 1265564 avalia (à luz dos artigos 114, I, e 202, § 2º da Constituição Federal) a competência para julgar ações ajuizadas contra empregadores com o objetivo de obter pagamento de diferenças salariais, com a subsequente inclusão dessas diferenças nas contribuições feitas à entidade fechada de previdência complementar (EFPC) vinculada.
O Tema, que recebeu a numeração 1166, tem Luiz Fux como relator, que, em sua decisão, afirmou “a necessidade de se atribuir racionalidade ao sistema de precedentes qualificados, assegurar o relevante papel deste Supremo Tribunal como Corte Constitucional e de prevenir tanto o recebimento de novos recursos extraordinários como a prolação desnecessária de múltiplas decisões sobre idêntica controvérsia”.
O ministro, defendendo a adoção da sistemática de repercussão geral, propôs a tese de que compete “à Justiça do Trabalho processar a julgar causas ajuizadas contra o empregador nas quais se pretenda o reconhecimento de verbas de natureza trabalhista e os reflexos nas respectivas contribuições para a entidade de previdência privada a ele vinculada”.
A questão merece ser analisada à luz dos recursos extraordinários RE 586.453 e RE 583.050, julgados pelo STF em 2013 (Tema 190 de repercussão geral)[1], quando foi definida a competência da Justiça Comum Civil para “processar e julgar causas que envolvam complementação de aposentadoria por entidades de previdência privada”, justamente em razão do caráter autônomo do direito previdenciário privado e a sua completa desvinculação do contrato de trabalho.
O reflexo de verbas trabalhistas nas contribuições devidas à entidade previdenciária pressupõe análise do direito previdenciário privado, notadamente do regulamento do plano de benefícios. Portanto, em nossa visão, a tese proposta por Luiz Fux não está em harmonia com o entendimento adotado pelo próprio STF no Tema 190.
Além disso, a tese proposta não define se o benefício complementar seria revisto e o seu respectivo custeio, ou seja, a recomposição integral das reservas garantidoras para fazer face ao novo benefício. Nos parece que a proposta tende a determinar um ambiente de insegurança jurídica para as EFPC e seus patrocinadores.
A prevalecer a tese, haverá um conflito com o entendimento já pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) nos temas 955[2] e 1.021[3], segundo o qual “é inviável a inclusão dos reflexos de quaisquer verbas remuneratórias reconhecidas pela Justiça do Trabalho nos cálculos da renda mensal inicial dos benefícios de complementação de aposentadoria”.
O Tema 1166 do STF é, sem dúvida, um grande desafio para o sistema fechado de previdência complementar e demanda especial atenção dos operadores de direito e gestores de EFPC. Seguimos acompanhando o debate.
Flavio Martins Rodrigues, sócio sênior (frodrigues@bocater.com.br)
Fernanda Rosa Milward, sócia (frosa@bocater.com.br)
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[1] Acórdão publicado em 06.03.2013.
[2] Acórdão publicado em 16.08.2018, nos autos do REsp 1.312.736/RS.
[3] Acórdão publicado em 11.12.2020, nos autos do nº REsp 1.740.397/RS e REsp 1.778.938/SP.