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STJ esclarece extensão da tese sobre regulamento aplicável a participante de previdência privada

Como reportamos na edição de maio de nossa Newsletter[1]a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou tese a respeito do regulamento aplicável ao participante de plano fechado de previdência privada, para cálculo da renda mensal inicial da complementação de aposentadoria[2]:

O regulamento aplicável ao participante de plano fechado de previdência privada para fins de cálculo da renda mensal inicial do benefício complementar é aquele vigente no momento da implementação das condições de elegibilidade, haja vista a natureza civil e estatutária, e não o da data da adesão, assegurado o direito acumulado. (grifo nosso)

Na oportunidade, o Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva esclareceu que “[…] seja sob a égide da Lei nº 6.435/1977 (arts. 34, § 1º, e 42, IV) ou da Lei Complementar nº 108/2001 (arts. 4º e 6º) e da Lei Complementar nº 109/2001 (arts. 17 a 22), sempre foi permitida à entidade fechada de previdência privada alterar os regulamentos dos planos de custeio e de benefícios como forma de manter o equilíbrio atuarial das reservas e cumprir os compromissos assumidos diante das novas realidades econômicas e de mercado que vão surgindo ao longo do tempo” (grifo nosso).

A decisão foi objeto de quatro embargos de declaração[3], dentre os quais o recurso da Federação Nacional das Associações de Aposentados Pensionistas e Assistidos do Sistema Petrobras e Petros (Fenaspe). 

Em suma, a Fenaspe questionou a extensão da tese fixada no julgamento do Tema 907 “[…]  à situação específica dos participantes e assistidos que aderiram aos fundos de pensão atualmente patrocinados por empresas estatais (regidos pela Lei Complementar nº 108/2001) em data anterior à vigência da Lei nº 6.435/77, quando a relação destas empresas para com os fundos não era de patrocínio, mas, sim, de manutenção”. Para a federação, os fundamentos do acórdão seriam inaplicáveis nesses casos, pois os contratos de previdência complementar regiam-se pelas disposições da lei civil. Assim, o regramento da forma de cálculo do benefício contratado na data da adesão estaria sob a proteção do ato jurídico perfeito e do direito adquirido.

Em 1º de outubro último, foi publicado acórdão no qual a Segunda Seção do STJ concluiu pela inexistência dos vícios ensejadores dos declaratórios, sobretudo porque esclareceu:

(i) que a relação jurídica estabelecida entre o participante e a entidade fechada de previdência privada é sempre de índole civil e estatutária, e não trabalhista;

(ii) que o regulamento aplicável ao participante de plano de previdência privada, para fins de cálculo da renda mensal inicial do benefício complementar, é aquele vigente na data da aposentadoria do participante;

(iii) que não há direito adquirido, mas mera expectativa de direito, à aplicação as regras de concessão da aposentadoria suplementar quando da admissão do participante no plano, sendo apenas assegurada a incidência das disposições regulamentares vigentes na data em que ele cumprir todos os requisitos exigidos para obtenção do benefício, tornando-se elegível, isto é, só há direito adquirido quando estiverem preenchidos os requisitos necessários à percepção do benefício complementar, ressalvado, entretanto, o direito acumulado; 

(iv) por conseguinte, que não há falar em ofensa ao princípio da confiança ou em inobservância ao ato jurídico perfeito enquanto não implementadas todas as condições de elegibilidade do benefício (fls. 2.359-2.370 e-STJ).

(grifos no original)

A conclusão alcançada pelo STJ se fundamenta na forma jurídica do contrato civil por prazo indeterminado, que admite: (i) a resilição por decisão unilateral da parte (no caso, pelo patrocinador por meio da retirada de patrocínio – “alteração máxima”); e (ii) a oferta pelo patrocinador de novas condições contratuais (alteração do regulamento), que poderão ser acolhidas ou não pelo participante que não tenha implementado todas as condições para o jubilamento (“alteração intermediária”).

Portanto, apesar da ausência de norma específica anterior à Lei nº 6.435/1977, o acórdão de 1º de outubro prestigiou a tutela jurídica do Direito Civil e afastou qualquer controvérsia acerca da extensão da tese fixada no julgamento do Tema 907, reafirmando a inexistência de direito adquirido antes da implementação dos requisitos necessários à concessão do benefício.

O entendimento encontra-se em perfeito alinhamento com a legislação geral civil e as regras especiais do sistema de previdência privada e a jurisprudência da Corte, prestigiando a estabilidade e segurança jurídica e financeiro-atuarial do sistema de previdência complementar fechado.

Flavio Martins Rodrigues, sócio sênior (frodrigues@bocater.com.br)
Fernanda Rosa S. Milward Carneiro, advogada (frosa@bocater.com.br)
Beatriz Gomes, advogada (bgomes@bocater.com.br)

[1] PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR FECHADA: STJ fixa tese sobre Regulamento aplicável na Renda Inicial de Benefício (Tema nº 907)
[2] Tese fixada no julgamento do Recurso Especial representativo de controvérsia nº 1.435.837/RS (Tema 907)
[3] Os embargos foram de Fenaspe, Senergisul, Instituto de Defesa Coletiva e  Ronaldo Ximenes Carneiro, e buscavam esclarecer as seguintes questões, respectivamente: (i) a extensão da tese ao caso dos participantes que tenham aderido ao plano de benefícios em época anterior à Lei nº 6.435/1977; (ii) a ausência de manifestação da Segunda Seção acerca de questão processual de ordem suscitada pelo Ministro Moura Ribeiro; (iii) a omissão da Segunda Seção a respeito do pedido de ingresso do Instituto Defesa Coletiva como amicus curiae no processo; e (iv) a falta de esclarecimento no acórdão acerca do procedimento do cálculo da renda mensal inicial da complementação de aposentadoria.

 

Autores

Flavio Martins Rodrigues, Fernanda Rosa S. Milward Carneiro e Beatriz Gomes

Área de atuação

Previdência Complementar e Investidores Institucionais

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