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STJ: cabe ação rescisória em face de decisão que decreta falência

Em julgamento do dia 3 de dezembro de 2019, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acatou o recurso especial nº 1780442, reconhecendo a possibilidade de ação rescisória em face de decisão que decreta falência de sociedade empresária, conforme o artigo 485 do Código de Processo Civil (CPC) de 1973 (equivalente ao atual art. 966 do CPC de 2015).

A Quarta Câmara do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) havia julgado a ação rescisória extinta, sem resolução do mérito, em razão da falta de interesse de agir, por entender que a decisão que decreta falência tem natureza de decisão interlocutória, ao tempo em que a ação rescisória somente seria cabível em face de sentenças de mérito.

Ao julgar o recurso especial, a Ministra do STJ Nancy Andrighi considerou que há muito o Tribunal já havia firmado entendimento sobre o cabimento de ação rescisória em face de decisões interlocutórias que, embora possuam essa natureza, na prática enfrentem algum mérito.

Assim, na medida em que a decisão que decreta falência impõe à sociedade empresária sua dissolução e ainda inaugura um regime jurídico distinto (o regime falimentar), não haveria razão para se impedir o ajuizamento de ação rescisória.

A Ministra foi precisa ao ressaltar que a previsão de cabimento de agravo ante decisão que decreta falência (previsto no art. 100 da Lei nº 11.101/2005, a “Lei de Recuperação Judicial e Extrajudicial e de Falência”) é meramente procedimental, não significando que aquela decisão não verse sobre mérito. Segundo o seu entendimento, a previsão de agravo de instrumento se dá em razão de o processo falimentar ser dividido em fases, “havendo a necessidade de se manter o processo no juízo de origem, após a quebra, para o processamento da segunda etapa, quando ocorrerá a arrecadação dos bens do falido e a apuração do ativo e do passivo, com a finalidade satisfação dos créditos”.

Sem prejuízo do correto entendimento do STJ sob o ponto de vista processual, devemos destacar os riscos à segurança jurídica com a possibilidade de rescisão de decisão de quebra de sociedade empresária. Embora as hipóteses de cabimento da ação rescisória sejam bastante restritas, o prazo para seu ajuizamento é de dois anos a contar do trânsito em julgado da decisão rescindenda, sendo possível que o julgamento definitivo da rescisória possa levar anos a partir do seu ajuizamento.

Ao longo desse período, caso não tenha sido requerida ou concedida, na ação rescisória, a tutela provisória prevista no art. 969 do CPC para impedir o cumprimento da decisão que decretou a falência, é possível que diversos atos de difícil ou impossível reversão tenham sido realizados, tais como alienação de ativos e pagamento de credores. Assim, há um grave risco de que interesses de uma quantidade expressiva de terceiros (adquirentes de ativos ou credores que já tenham recebido seus créditos) sejam afetados enquanto a decisão de quebra produzia efeitos.

Daí porque é necessário que os Tribunais, uma vez autorizados a rever decisões de quebra em ação rescisória, ajam com cautela e celeridade, de modo a evitar os riscos e prejuízos decorrentes da rescisão de uma decisão de quebra muitos anos após o início do procedimento falimentar.

Bruno Carriello, sócio (bcarriello@bocater.com.br).
Germano Rego Pires da Costa, associado (gcosta@bocater.com.br)

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Bruno Carriello e Germano Rego Pires da Costa

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