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STJ decide que contrato bancário remunerado pelo CDI não ofende a Súmula 176

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no âmbito do REsp 1781959/SC, em julgamento realizado em 20 de fevereiro, proferiu importante decisão que dá correta interpretação à Súmula 176 da própria Corte, cujo teor diz que “É nula a cláusula contratual que sujeita o devedor à taxa de juros divulgada pela ANBID/CETIP”.

A importância de tal decisão reside em corrigir o rumo de julgados que aplicavam indevidamente a Súmula 176, para afastar a possibilidade de utilização da Taxa do Certificado de Depósito Interbancário (CDI) em contratos, em razão da Taxa CDI ser divulgada pela CETIP. É o que ocorreu, recentemente, em julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo:

EMBARGOS À EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO – SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA – APELAÇÃO DO EXEQUENTE – CDI – Utilização como encargo financeiro – Ilegalidade – Súmula 176 do C. STJ – Nulidade da cláusula que determina a aplicação desse índice, apurado e divulgado pela Central de Liquidação e Custódia Financeira de Títulos (CETIP), por ficar a critério exclusivo da instituição financeira – Substituição do CDI pela Tabela Prática do TJSP – Sentença mantida. Recurso não provido.
(TJSP, AC 1089958-44.2018.8.26.0100, Rel. Des. MARINO NETO, 11ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO, j. em 12/07/2019)

A Súmula 176/STJ foi editada em 1996, quando ainda não havia sido popularizada a emissão de títulos atrelados à percentual de variação do CDI. Atualmente, a vinculação de um investimento ou financiamento a percentual de variação do CDI é algo extremamente comum, inclusive em títulos de renda fixa oferecidos a pessoas físicas. Por isso, a equivocada aplicação da Súmula 176/STJ a contratos fixados por tal índice gerava enormes riscos à segurança jurídica.

Explica-se que, à época da edição da referida súmula, a vedação da aplicação da taxa ANBID/CETIP tinha razão no fato daquela taxa ser decidida pelas próprias instituições financeiras, não se tratando de uma taxa calculada a partir do mercado, mas sim de uma taxa convencionada pelas instituições financeiras, que poderiam, então, agir de modo a prejudicar o devedor. Situação inversa ocorre com o CDI, por ser taxa calculada partir de critérios macroeconômicos e de mercado.

Assim, o problema surgiu quando o CDI se popularizou e os tribunais, sem observar o racional que levou à edição da súmula, bem como as diferenças conceituais entre as taxas ANBID/CETIP e o CDI, passaram a interpretá-la como se toda e qualquer taxa divulgada pela CETIP estivesse por ela abrangida.

Tal panorama impôs uma atuação do STJ para dirimir a controvérsia e interpretar a Súmula 176/STJ corretamente, julgando a licitude dos contratos bancários fixados em percentual do CDI.

O acórdão, bastante didático até mesmo em termos econômicos, discorre sobre a natureza da taxa CDI, conceituando que “é o instrumento por meio do qual ocorre a troca de recursos exclusivamente entre instituições financeiras, de forma a conferir maior liquidez ao mercado bancário e permitir que as instituições que têm recursos sobrando possam emprestar àquelas que estão em posição deficitária”.

Por sua vez, salienta se tratar de taxa calculada a partir do mercado, destacando que “Não é potestativa a cláusula que estipula os encargos financeiros de contrato de abertura de crédito em percentual sobre a taxa média aplicável aos Certificados de Depósitos Interbancários (CDIs), visto que tal indexador é definido pelo mercado, a partir das oscilações econômico-financeiras, não se sujeitando a manipulações que possam atender aos interesses das instituições financeiras”.

Por outro lado, o STJ destacou que a abusividade da taxa pode ser declarada quando tal fato for verificado “no julgamento do caso concreto em função do percentual fixado pela instituição financeira, comparado às taxas médias de mercado regularmente divulgadas pelo Banco Central do Brasil”. Em outras palavras, a utilização do CDI é legal, podendo apenas o percentual utilizado ser declarado abusivo, quando o percentual fixado se mostrar dissonante dos parâmetros de mercado.

De toda forma, o acórdão dirimiu corretamente a controvérsia, permitindo que a vontade das partes que contrataram a incidência do CDI seja mantida pelo Judiciário, e não substituída judicialmente por índice diverso, o que certamente trará maior segurança e previsibilidade para as partes contratantes.

Bruno Carriello, sócio (bcarriello@bocater.com.br)
Germano Pires da Costa, advogado (gcosta@bocater.com.br)

 

 

Autores

Bruno Carriello e Germano Pires da Costa

Área de atuação

COntratos e Planejamento Patrimonial

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