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STF: substituição de depósito judicial por seguro garantia em tempos de pandemia da Covid-19

Em decisão monocrática proferida no dia 13 de maio[1] o Ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), indeferiu o pedido de substituição dos valores depositados pelo Banco Volkswagen nos autos do ARE n.º 1.239.911 por seguro garantia judicial, cuja apólice contemplaria montante equivalente aos depósitos atualizados dos débitos de natureza tributária.

A instituição financeira utilizou como fundamento do pedido as dificuldades econômicas enfrentadas durante a pandemia de Covid-19, em termos de fluxo de caixa e liquidez da rede produtiva, considerando o aumento da inadimplência de clientes, a necessidade de renegociações dos vencimentos de parcelas e empréstimos firmados anteriormente, como também a disponibilidade de capital de giro para as concessionárias de veículos da cadeia de produção.

Por outro lado, a Procuradoria da Fazenda Nacional argumentou que o levantamento de depósitos judiciais acarretaria na desmontagem do funcionamento estatal, na medida em que tais valores passam a pertencer ao Orçamento da União desde o momento de sua efetivação, tornando-se receita pública disponível para o Tesouro Nacional, conforme determinado pelo artigo 1º, §2º da Lei 9.703/1998, os quais estariam sendo utilizados para a consecução de políticas públicas para atendimento de toda a sociedade em tempos de pandemia.

Diante desse cenário, o Ministro Fux, ao analisar o pedido de tutela de urgência e considerar os argumentos acerca do perigo de dano, concluiu que, ao menos em um juízo preliminar, deveria prevalecer o interesse público sobre o interesse privado. Além disso, destacou-se a importância da plausibilidade do direito no caso concreto para fins de autorização da substituição da garantia.

No caso em análise, embora tenha sido comprovada a circunstância especial de dificuldade financeira devido à pandemia, em nenhum momento, no mérito, o Poder Judiciário entendeu que não estaria configurada a probabilidade do direito invocado, que é um dos pré-requisitos necessários à concessão da tutela de urgência.

A partir da análise desse recente precedente, e considerando os impactos negativos causados pela pandemia na situação econômica de diversos contribuintes, verifica-se que as chances de êxito relativas aos pedidos de substituição de depósito por seguro-garantia serão mais plausíveis quando pleiteadas em ações que versem sobre teses já pacificadas pela jurisprudência, sumuladas, julgadas sob a sistemática da Repercussão Geral e dos Recursos Repetitivos ou, ainda, em sede recursal, quando já tenham sido proferidas decisões favoráveis nas instâncias inferiores.

Embora a decisão monocrática do STF tenha sido negativa em relação à possibilidade de substituição de depósito por apólice de seguro no caso, já que o interesse público deve, em regra, prevalecer sobre o privado, verifica-se que tal regramento não é absoluto, podendo ser alterado através do sopesamento dos princípios constitucionais e das peculiaridades do caso.

Assim, nestes casos, faz-se imperiosa a análise das situações específicas de cada contribuinte, que deverão legitimar a substituição da garantia através da demonstração individualizada do perigo de dano devido à pandemia, comprovando, também, a plausibilidade da tese aventada, de modo que, quanto maior for a probabilidade do direito, maiores serão as chances de sucesso na obtenção da medida.

Vale lembrar, a este respeito, que a orientação colhida de julgamento no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), também firmada logo após o início da pandemia, caminha em sentido oposto, inclusive reconhecendo, em certa medida, a equiparação feita pelo legislador entre os institutos (depósito e seguro-garantia), notadamente nos artigos 835, §2º, do CPC/15[2] e no art. 15, I[3], da Lei n.º 6.830/80 (Lei de Execuções Fiscais).

A nossa equipe tributária seguirá atenta às novidades quanto ao tema, colocando-se à disposição dos clientes para dirimir dúvidas ou avaliar os respectivos cenários individuais.

 

Alexandre Luiz Moraes do Rêgo Monteiro, sócio (amonteiro@bocater.com.br)
Luciana Ibiapina Lira Aguiar, sócia (laguiar@bocater.com.br)
Francisco Lisboa Moreira, sócio (fmoreira@bocater.com.br)
Bruna Almeida Santos, advogada (balmeida@bocater.com.br)
Bruno Ferreira Vieira, advogado do escritório parceiro Miguez de Mello Advogados (bruno@miguez.com.br)

 

 

 

1. Decisão monocrática relativa ao pedido de tutela de urgência pleiteado nos autos do Agravo em Recurso Extraordinário n.º 1.239.911/SP.

2. Art. 835. (…) § 2º Para fins de substituição da penhora, equiparam-se a dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior ao do débito constante da inicial, acrescido de trinta por cento.

3. Art. 15 – Em qualquer fase do processo, será deferida pelo Juiz: I – ao executado, a substituição da penhora por depósito em dinheiro, fiança bancária ou seguro garantia (…).

 

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