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CVM regulamenta a aquisição, por companhias abertas, de debêntures de sua própria emissão

Em 17 de março, foi publicada a Instrução CVM nº 620 (ICVM 620)[1], definindo os parâmetros a serem seguidos para a aquisição de debêntures de própria emissão da companhia, observando o disposto no parágrafo 3º do art. 55º da Lei das S.A.[2] .

O foco da ICVM n° 620 não se limita a operações de aquisição com valor igual ou inferior ao valor nominal, uma vez que tais operações representam somente uma diminuição do valor da dívida da emissora, buscando permitir à companhia uma atuação eficiente na gestão de endividamentos.

Conforme estabelece o art. 2° da ICVM 620, as debêntures devem, necessariamente, ser:

(a)  emitidas por companhias que tenham sido objeto de oferta pública de distribuição registrada ou dispensada de registro pela CVM; e

(b)  emitidas por companhias que estejam admitidas para negociação nos mercados regulamentados de valores mobiliários.

Adicionalmente, a ICVM 620 traz a obrigação da emissora de informar os detalhes das operações realizadas nos respectivos relatórios da administração e demonstrações financeiras[3] dos emissores.

No tocante à possibilidade de resgate parcial de debêntures da mesma série, restou definido na ICVM 620 que este poderá ocorrer:

(i)          por meio de sorteio a ser realizado com os titulares das debêntures, ou

(ii)         pela aquisição das debêntures no mercado organizado de valores mobiliários, caso o preço de aquisição seja inferior ao valor nominal atualizado.

Destaca-se que as debêntures resgatadas através deste procedimento devem ser canceladas para retirada de circulação.

A aquisição facultativa das debêntures de própria emissão, pelas companhias emissoras, pode se realizar por valor igual ou inferior ao seu valor nominal [4], ou por valor superior ao valor nominal.

Na hipótese de aquisição da totalidade, ou de determinada quantidade de debêntures de mesma emissão ou série, deve o emissor informar se a oferta permanecerá válida, mesmo que a quantidade de debêntures oferecidas sejam inferiores ou superiores àquela indicada na comunicação, permitindo-se que o titular da debênture declare condições específicas para sua aceitação.

Os debenturistas devem manifestar sua aceitação à oferta de aquisição, dentro do prazo indicado na respectiva comunicação de oferta de aquisição, que não pode ser menor que 15 dias da data de comunicação. É permitida a revogação da aceitação até o final do prazo de manifestação concedido. Contudo, tal disposição também se aplica à emissora, quanto à revogação ou alteração da oferta de aquisição, desde que respeitado o disposto no § 9º do art. 9º.

No caso em que são ofertadas mais debêntures do que originalmente indicadas na comunicação, pode a emissora: (i) realizar um procedimento de coleta de intenções, por meio do qual adquirirá a quantidade de debêntures originalmente indicada na comunicação; ou (ii) realizar a aquisição de todas as debêntures dos debenturistas aderentes à oferta de aquisição (em montante superior ao originalmente pretendido); ou (iii) adotar procedimento de rateio, de forma equitativa, entre os debenturistas aderentes, sendo certo que todos os ofertantes deverão ter ao menos uma debênture adquirida.

Quando adotado o procedimento de coleta de intenções, os debenturistas que aceitarem a oferta deverão indicar o valor do prêmio de aquisição que aceitam receber[5]. Uma vez concluído o procedimento de coleta das intenções, todas as debêntures objeto da oferta de aquisição (indicadas na comunicação) deverão ser adquiridas, a partir dos menores prêmios de aquisição até os maiores, adotado o critério de maior benefício à emissora.

A ICVM 620 também prevê a possibilidade de aquisição das debêntures para permanência em tesouraria. À semelhança das regras de aquisição de ações para manutenção em tesouraria, é facultado à emissora: (i) a manutenção das debêntures em tesouraria, (ii) seu cancelamento ou (iii) sua alienação, ficando, ainda, dispensada a contratação de serviço de serviços de custódia para as que permanecerem em tesouraria.

Importante ressaltar, contudo, que as debêntures mantidas em tesouraria, na forma prevista na ICVM 620, não têm direito a voto em Assembleias Gerais de Debenturistas, nem a proventos em dinheiro, devendo ser desconsideradas no cômputo dos quóruns de instalação e deliberação previstos na Lei das S.A. e normas da CVM, até serem recolocadas no mercado.

Certamente, a ICVM n° 620 representa um estímulo ao mercado secundário de debêntures uma vez que “busca assegurar informações suficientes e tratamento equitativo aos debenturistas, ao mesmo tempo em que preserva a flexibilidade e agilidade das companhias emissoras”[6].

A ICVM 620 entrará em vigor em 02 de janeiro de 2021, sendo aplicável, inclusive, às debêntures que já estejam em circulação na data de início de sua vigência.

Luiza Rangel de Moraes, sócia (lrangel@bocater.com.br)
Daniel Chedier Barreira Maurell, trainee (dmaurell@bocater.com.br)
Bruna Rosa, estagiária (brosa@bocater.com.br)

[1] Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/legislacao/instrucoes/inst620.html>

[2] “Art. 55. A época do vencimento da debênture deverá constar da escritura de emissão e do certificado, podendo a companhia estipular amortizações parciais de cada série, criar fundos de amortização e reservar-se o direito de resgate antecipado, parcial ou total, dos títulos da mesma série. § 3o  É facultado à companhia adquirir debêntures de sua emissão:  I – por valor igual ou inferior ao nominal, devendo o fato constar do relatório da administração e das demonstrações financeiras; ou  II – por valor superior ao nominal, desde que observe as regras expedidas pela Comissão de Valores Mobiliários.”

[3] “Art. 6º Independentemente do preço praticado, a companhia emissora deve informar a aquisição de debêntures de sua emissão no relatório da administração e nas demonstrações financeiras.

[4] Art. 5º Caso o preço de aquisição seja igual ou inferior ao valor nominal atualizado, a companhia emissora pode adquirir debêntures de sua emissão: I – por meio de operações no mercado de valores mobiliários no qual seja admitida à negociação; ou II – por meio do procedimento previsto na seção II deste capítulo

[5] Assim entendido como o percentual do preço de aquisição, superior ao valor nominal atualizado, que o respectivo debenturista aceita receber na Oferta.

[6] Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/noticias/arquivos/2020/20200317-1.html>

 

Autores

Luiza Rangel de Moraes, Daniel Chedier Barreira Maurell e Bruna Rosa

Área de atuação

Mercado de Capitais

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