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CVM edita Ofício-Circular com orientações sobre demonstrações financeiras de 2019

No último dia 5 de fevereiro, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) editou o Ofício-Circular CVM/SNC/SEP n.º 01/2020, contendo orientações quanto a aspectos relevantes a serem observados na elaboração das Demonstrações Financeiras para o exercício social encerrado em 31 de dezembro de 2019.

O Ofício-Circular repete todos os temas abordados no Ofício-Circular CVM/SNC/SEP 01/2019 e inova apenas quanto ao Elucidação do Ofício Circular SNC/SEP n. 02/2019 – CPC 06 (R2)/IFRS 16 e 3. Adoção Inicial CPC n. 47 e n. 48 – Concessionárias Transmissoras de Energia Elétrica.

A seguir comentamos os novos tópicos e alguns destaques dos tópicos abordados no ano anterior e novamente enfatizados.

Contratos de Leasing – CPC 06 (R2): a CVM busca esclarecer o escopo do CPC06-R2 bem como a interpretação das disposições contidas no Ofício Circular CVM SNC/SEP/n. 02/2019, de 18 de dezembro de 2019, sintetizando suas orientações sobre as possíveis decisões em matéria de reporte por parte das companhias da seguinte forma:

Adoção Inicial CPC n. 47 e n. 48 – Concessionárias Transmissoras de Energia Elétrica: A CVM entende que as companhias transmissoras de energia elétrica devem apresentar em nota explicativa, anexa às suas demonstrações contábeis, uma conciliação dos números, evidenciando a movimentação dos saldos do ativo de contrato e do ativo financeiro, antes e após os efeitos da implementação dos pronunciamentos CPC n. 47 e n. 48.

Foi observado a divulgação de informações inadequadas e/ou incompreensíveis referentes à adoção inicial do CPC 47 e 48 nas demonstrações relativas a 31 de dezembro de 2018 de algumas companhias do setor e o Ofício ressalta que a adoção inicial desses pronunciamentos não pode servir para omitir erros imputados ao passado.

Operações com Fundo de Investimento em Participações (FIP): a situação comentada se refere a venda de participação societária em entidade operacional a um FIP (em regra tendo como cotista um banco), contemplando contrato de “swap” por meio do qual vendedor (controlador) e cotista do FIP trocam fluxos de caixa futuros advindos da diferença observada entre o valor de venda no mercado da participação societária e o valor de custo da participação societária detida atualizado (variação do CDI mais um “spread”, ajustado por dividendos distribuídos).

O FIP mantém a participação societária por um dado período e vende-a posteriormente. Se a venda se realizar abaixo do custo da participação societária detida atualizado (preço de compra atualizado pela variação do CDI mais um “spread” e descontado de dividendos distribuídos), o controlador fica obrigado a restituir a diferença ao FIP. Por outro lado, se a venda se realizar acima desse custo, o lucro é compartilhado entre controlador e FIP.

A CVM entende que a essência econômica dessa operação indica se tratar de financiamento com ativo (participação societária) dado em garantia. Para que a representação seja considerada fidedigna, Resultado com Equivalência Patrimonial, o passivo “Empréstimos” e a despesa financeira respectiva devem ser reconhecidos pelo controlador.

Operações com Fundo de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) com cotas seniores e mezanino: a situação comentada se refere a oferta as companhias de produtos financeiros que resultariam no “desreconhecimento” de recebíveis (ativos), sem o reconhecimento de passivo a que estariam sujeitas.

As cotas subordinadas seriam subscritas pelo cedente dos recebíveis e representariam uma pequena parcela do PL do FIDC. As cotas mezanino seriam subscritas por investidor (ex. banco), teriam característica de operação de risco e representariam uma parcela equivalente ao histórico de perdas com a inadimplência na carteira de recebíveis da companhia.

As cotas mezanino absorveriam perdas, somente depois de eventuais perdas consumirem as quotas juniores. Os cedentes se comprometeriam a fornecer recursos ao fundo para servirem de “colchão”, para cobrir custos de operação e demais eventualidades (problemas de “default” da carteira). Após resgate e amortização de todas as quotas do Fundo, esse “colchão”, caso não utilizado, retornaria ao cedente.

Na essência, segundo a CVM, o cedente continuaria retendo os riscos advindos da carteira de recebíveis “alienada” e auferiria os benefícios econômicos por ela gerados, ainda que a cessão fosse feita sem coobrigação, sem direito de regresso, o que a princípio indicaria uma transferência de riscos e benefícios dos recebíveis por parte do cedente.

Objetivamente, a CVM definiu que a venda de recebíveis para ser considerada definitiva sob o aspecto contábil, deve atender aos critérios de “desreconhecimento” previstos no CPC n. 48 (IFRS n. 9). Ademais, quando um veículo estruturado for utilizado, cabe aos administradores da companhia julgar se há necessidade de consolidação dessa entidade “veículo”.

ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS: Tema abordado no Ofício de 2019, nesta oportunidade a CVM enfatiza que ainda é aguardada a análise dos embargos de declaração apresentados ao STF no RE 574.706,para esclarecimentos a respeito da modulação dos efeitos da decisão proferida em 2017.

Ademais a orientação geral é para que tratamento contábil dispensado à matéria seja avaliado à luz do que prescreve o CPC25 (IAS 37), lembrando que ativos contingentes, como princípio, jamais são reconhecidos, sendo objeto de divulgação em nota explicativa apenas se for um ganho considerado como provável.

Provisões reconhecidas podem ser total ou parcialmente revertidas, desde que observado o que prescreve o §59 do CPC25.

O tema deve ser avaliado caso a caso, considerando o teor de cada decisão e as respectivas peculiaridades, sendo indispensável uma boa divulgação das decisões tomadas pela administração da companhia, bem como as bases sobre as quais estão assentadas, e os efeitos dessas decisões sobre o balanço patrimonial, a demonstração do resultado e a demonstração dos fluxos de caixa.

A preocupação das áreas técnicas da CVM é quanto ao risco de “misleading”, cujas consequências são extremamente prejudiciais aos investidores do mercado de capitais brasileiro e demandam a atuação do Órgão Regulador.

Passivos e fontes de incertezas: As áreas técnicas da CVM chamam a atenção para o exame, por tarde da administração das companhias abertas de fatos e circunstâncias que indiquem a necessidade de constituição tempestiva de uma provisão, em vez de evidenciação de um passivo contingente em nota explicativa.

Instrução CVM 319/99 x ICPC 09: A CVM ressalta que o conteúdo da Instrução CVM n. 319/99 acerca do tratamento contábil de incorporações reversas, continua plenamente vigente e deve ser aplicado quando o caso concreto envolver uma incorporação reversa, nos moldes então disciplinados.

A Autarquia observa, no entanto, que nos casos em que não houver a interposição de empresa “veículo”, ou seja, quando a incorporada é a investidora original, e desde que haja substância econômica e que permaneçam válidos os fundamentos econômicos que deram origem ao ágio, este deveria ser mantido na sua integralidade, recebendo  tratamento de acordo com as condições originalmente estabelecidas. Neste caso, a constituição da provisão mencionada na Instrução CVM n. 349/01 poderia ser desnecessária ou mesmo indevida.

Declaração de conformidade das Notas Explicativas: A CVM releva mais uma vez a obrigatoriedade de a administração de companhias abertas subscrever declaração de conformidade, nos termos do item 38 da OCPC n. 07 , acerca das informações relevantes próprias das demonstrações contábeis, e somente elas, estarem evidenciadas e que corresponderem às utilizadas pela administração em sua gestão.

Outros temas tratados no Ofício: “True and fair view”, Operações de “forfait”; Testes de “impairment”; Notas Explicativas; Julgamento da Administração da Companhia “going concern”, Instrumentos Financeiros; Aplicação do Conceito de “Compulsão Econômica”, Reconhecimento de Receita por Companhias do Setor de Incorporação Imobiliária; Hedge Accounting – CPC n. 38 e CPC n. 48; Combinação de Negócios; Período de Mensuração – “Goodwill” ou Ganho por Compra Vantajosa; Mudança de políticas contábeis; Equivalente de caixa – LFTs; Alguns Aspectos dos Contratos de Leasing – IFRS n. 16, IRPJ e CSLL Diferidos.

Luciana I. Lira Aguiar, sócia (laguiar@bocater.com.br)

Alexandre Luiz M. R. Monteiro, sócio (amonteiro@bocater.com.br)

Francisco Lisboa Moreira, sócio (fmoreira@bocater.com.br)

 

Autores

Luciana I. Lira Aguiar, Alexandre Luiz M. R. Monteiro e Francisco Lisboa Moreira

Área de atuação

Mercado de Capitais

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