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Aumento da CSLL para bancos é aprovada com a Reforma da Previdência

No último dia 23 de outubro, a Proposta de Emenda Constitucional 06/2019 (PEC 06/2019), sobre a Reforma da Previdência, foi aprovada no Senado Federal.

A redação final do texto contempla em seu art. 32 a majoração da alíquota da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) aplicável aos bancos, como segue:

“Art. 32. Até que entre em vigor lei que disponha sobre a alíquota da contribuição de que trata a Lei n° 7.689, de 15 de dezembro de 1988, esta será de vinte por cento no caso das pessoas jurídicas referidas no inciso I do § 1º do art. 1º da Lei Complementar nº 105, de 10 de janeiro de 2001.”

Por ter sido inserida de forma incidental, num dispositivo que trata de uma matéria essencial para o País, o aumento da alíquota acabou passando de forma discreta pelos debates e repercussões na tramitação do projeto.

Esse boletim visa abordar os principais aspectos relacionados a este dispositivo da lei.

1.    Histórico

A alíquota de CSLL aplicável às instituições financeiras e entidades equiparadas foi alterada diversas vezes desde a instituição dessa contribuição, na Constituição Federal (CF) de 1988.

A última alteração, introduzida pela Lei nº 13.169/2015, previu a adoção das seguintes alíquotas para as seguintes entidades:

As sociedades afetadas pelas sucessivas majorações ingressaram, individualmente ou por meio das confederações que as representam, com ações judiciais[1]  com o argumento de que a majoração aplicável a entidades de um segmento econômico feriria o princípio constitucional da isonomia.
A tese não tem sido acolhida nos tribunais brasileiros, como se observa nas decisões no RE 659.534-PR (2017), ARE 1.218.829 AgR/SP e ARE 1.175.895 AgR/SP (ambos de 2019). Contudo, são as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) que trarão a conclusão definitiva para a controvérsia.

2.    Questões sobre o art. 32 da PEC 06/2019

A quem se aplica?
Como a regra se refere às entidades citadas no inciso I, do art. 1º, da Lei Complementar 105/2001, sem excluir ou incluir outras entidades, a majoração para 20% será aplicável apenas aos bancos.

Para seguradoras, sociedades de capitalização e demais instituições equiparadas naquela oportunidade para esta finalidade, a alíquota permanecerá a mesma prevista na Lei nº 13.169/2015.

A partir de quando a nova alíquota deve ser aplicada?
O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, promulgou no dia 12 de novembro a PEC 06/2019. A vigência da maior parte das novas regras começa com a publicação da emenda no Diário Oficial da União (DOU), o que aconteceu no dia seguinte (13), exceto para os dispositivos com previsão de vigência em sentido diverso.

No caso da majoração da alíquota de CSLL, a partir da publicação da lei, observa-se o prazo de 90 dias para que a nova alíquota seja aplicável, em respeito ao previsto no art. 150, III, (c) da Constituição, e confirmado na decisão que fundamentou o tema de repercussão geral 107[2]. A própria PEC 06/2019 assim determina:
“Art. 36. Esta Emenda Constitucional entra em vigor:
I – no primeiro dia do quarto mês subsequente ao da data de publicação desta Emenda Constitucional, quanto ao disposto nos arts. 11, 28 e 32;”

É necessária a edição de legislação complementar para que a majoração da alíquota seja eficaz?
Não. O texto do art.32 já prevê que a nova alíquota (20%) deverá vigorar até que outra norma disponha em sentido diverso.

Quais são os efeitos esperados nas demonstrações financeiras dos bancos?
Do ponto de vista contábil, a promulgação da PEC 06/2019 poderá resultar nos seguintes efeitos relevantes:

a)    aumento dos saldos de ativos e passivos fiscais diferidos de CSLL, uma vez que os saldos de diferenças temporárias e de bases negativas de CSLL registradas nos livros fiscais estarão sujeitos à realização mediante a aplicação da nova alíquota (20%);
b)    eventual alteração de prazo estimado para a realização futura dos ativos e passivos fiscais diferidos CSLL, constante no estudo técnico exigido pela Resolução 3.059/02 do Conselho Monetário Nacional (CMN), uma vez que, com a elevação da alíquota, a CSLL devida será maior e, consequentemente, haverá a possibilidade de compensar os créditos tributários existentes de forma mais rápida.

Há algum efeito ainda em 2019 para os bancos?
Mesmo com a promulgação da PEC/06 em novembro e a emenda constitucional publicada em 31 de dezembro deste ano, o art. 32 só entrará em vigor em 2020.

Tal qual ocorreu em 2007, com a publicação da Medida Provisória (MP) 413, de 3 de janeiro de 2008, ao elaborar as demonstrações financeiras relativas à data-base 31 de dezembro de 2019, a PEC 06/2019 será de conhecimento público, mas o art.32 ainda não estará em vigência, com a  diferença que naquele caso, a MP não havia sido editada até o encerramento do exercício (foi no primeiro dia útil do ano seguinte).

Esta não é uma questão simples porque abarca análise jurídica relevante sobre a vigência e do conceito de vacatio legis [3], bem como a avaliação de diversos normativos contábeis.

Sob o ponto de vista contábil, a Circular 3.171/2002, do Banco Central do Brasil (Bacen), que estabelece procedimentos para reconhecimento, registro contábil e avaliação de créditos tributários e obrigações fiscais diferidas, dispõe que devem ser adotados os critérios e alíquotas vigentes na data-base da elaboração das demonstrações financeiras.

O art. 1, §2º, da Circular Bacen 3.071/2002 prevê ainda que em caso de alteração da legislação que modifique alíquotas a serem adotadas em períodos futuros, os efeitos devem ser “reconhecidos imediatamente com base nos critérios e alíquotas aplicáveis ao período em que cada parcela do ativo será realizada ou do passivo liquidada”.

Por “imediatamente” entendemos que a norma se refere ao primeiro momento no qual a regra esteja em vigor, ainda que as alíquotas só passem a ser aplicáveis em momento futuro, como foi o caso da Lei nº 13.169/2015, que trouxe previsão de alíquotas diversas para anos distintos.

Pode-se dizer que os bancos não terão alternativa realista de liquidar os passivos tributários diferidos senão à alíquota prevista na PEC 06/2019. A questão controversa, no entanto, está em definir o critério de mensuração do ativo e do passivo diferido em função da alíquota de CSLL majorada por lei em 2019, cuja vigência só ocorrerá a partir de 2020.

Para essas situações, as normas internacionais (equivalente ao Pronunciamento Técnico 32), assim se pronunciam:

48. Ativos e passivos correntes e diferidos são geralmente mensurados utilizando as alíquotas de tributos (e legislação fiscal) que estejam em vigor. Entretanto, em alguns países os anúncios de alíquotas de tributos (e legislação fiscal) pelo governo têm o efeito substantivo de promulgação real, a qual pode ocorrer muitos meses após o anúncio. Nesses países, os ativos e passivos fiscais devem ser mensurados usando a alíquota de tributo anunciada (e as leis fiscais).
(…)
51. A mensuração dos passivos fiscais diferidos e dos ativos fiscais diferidos deve refletir os efeitos fiscais que a entidade espera, ao final do período que está sendo reportado, recuperar ou liquidar o valor contábil de seus ativos e passivos.

A despeito do CPC32 não se aplicar aos bancos por não ter sido aprovado pelo Bacen, o conteúdo normativo acima traz um conceito alinhado à representação fidedigna, princípio basilar da Contabilidade, e que respalda a possibilidade de interpretar dessa mesma forma o conteúdo do parágrafo 2º, do art. 1º da Circular 3.071/2002, ensejando o registro contábil da CSLL diferida já à alíquota de 20% no balanço relativos a 31 de dezembro de 2019.

Em todo caso, se o Bacen se manifestar em sentido contrário pelo fato de a majoração da alíquota da CSLL ter vigência apenas após o encerramento do exercício de 2019, o tema deve ser objeto de divulgação em nota explicativa subsequente (conforme Resolução Bacen/CMN – 3.973/11).

Luciana Ibiapina Lira Aguiar, sócia (laguiar@bocater.com.br)

[1] Exemplos: Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5485 movida pela Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNSeg), e ADI 4101, movida pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif)
[2] Tema 107 – Majoração da alíquota da CSLL pela Emenda Constitucional nº 10/96.Tese: A Emenda Constitucional 10/1996, especialmente quanto ao inciso III do art. 72 do ADCT, é um novo texto e veicula nova norma, não sendo mera prorrogação da Emenda Constitucional de Revisão 1/1994, devendo, portanto, observância ao princípio da
[3] Vacatio Legis (vacância da lei) é um termo jurídico que corresponde ao período entre o dia da publicação de uma lei e o dia em que ela entra em vigor, ou seja, que passa a ter seu cumprimento obrigatório.

Autores

Luciana Ibiapina Lira Aguiar

Área de atuação

Tributário

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