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ANEEL abre Consulta Pública para recriar Comissão de Resolução de Conflitos das de Agências Reguladoras

Desde o início do mês de abril, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) está recebendo contribuições por meio da Consulta Pública nº. 026/2020, instaurada para obter subsídios para a recriação da Comissão de Resolução de Conflitos das Agências Reguladoras dos Setores de Energia Elétrica, Telecomunicações e Petróleo.

No passado, a Comissão de Resolução de Conflitos das Agências Reguladoras foi constituída por meio da edição da Resolução Conjunta nº. 02/2001[1] da ANEEL, da Agência Nacional de Telecomunicações (ANATEL) e da Agência Nacional do Petróleo (ANP).  Tal ato normativo disciplinava um mecanismo administrativo próprio para a resolução dos conflitos originados pela aplicação da Resolução Conjunta nº. 01/1999[2], que estabelecia o regulamento conjunto para compartilhamento de infraestrutura entre os setores regulados pelas referidas autarquias em regime especial.

A relevância do dever de compartilhamento dessas infraestruturas surge no âmbito do Direito Concorrencial em razão da denominada doutrina das essential facilities. Nesses casos, segmentos que dispõem de uma estrutura: (i) essencial para o desenvolvimento das demais etapas de fornecimento de um determinado serviço; (ii) não passível de duplicação, mas passível de compartilhamento; (iii) sob titularidade de um monopolista que nega injustificadamente o acesso a infraestrutura aos demais concorrentes demandam a intervenção estatal para contenção do abuso do poder econômico e consequente manutenção da competitividade dos setores atingidos.

No entanto, ainda que as agências reguladoras sejam capazes de disciplinar o compartilhamento das infraestruturas essenciais mediante a edição de atos normativos, essas entidades, usualmente, não são capazes de pacificar os conflitos advindos da aplicação desses dispositivos e que são inerentes à multiplicidade de agentes envolvidos na prestação de serviços regulados.

Diante disso, a Resolução Conjunta nº. 02/2001 gerou uma inovação no ambiente regulatório então existente, ao prever em seu artigo 27[3] que a Comissão de Resolução de Conflitos das Agências Reguladoras realizaria a conciliação dos agentes econômicos que não obtivessem sucesso em suas negociações privadas e, ainda, ao estabelecer em seu artigo 33[4] que, caso a conciliação fosse infrutífera, o colegiado da entidade proferiria uma decisão administrativa de caráter vinculante[5].

Contudo, mesmo sendo detentor de uma competência relevante para a disciplina dos setores de energia elétrica, telecomunicações e petróleo, a Comissão foi extinta, em 28 de junho de 2019, por ato do Presidente da República, na edição do Decreto nº. 9.759 de 2019[6]. Adotou-se o entendimento de que, não havia, à época de sua conformação, qualquer ato legal que disciplinasse a possibilidade de criação da comissão, assim como não havia qualquer previsão acerca da viabilidade de edição de resoluções conjuntas por agências reguladoras distintas.

Ainda que se extraia do ato do Poder Executivo que a recriação da Comissão de Resolução de Conflitos demandaria a edição de um decreto[7], deve-se ressaltar que, logo após a edição deste ato, sobreveio a Lei nº. 13.848 de 2019[8], que cria um arcabouço normativo para a atuação das agências reguladoras. Esta lei, em seu artigo 29[9], caput e §2º[10], prevê a possibilidade de articulação entre agências reguladoras mediante a edição de atos normativos conjuntos para a disciplina de agentes submetidos a mais de uma regulação setorial. Portanto, a recriação da Comissão não exige a edição de um decreto e pode ser feita por mera resolução conjunta editada pela ANEEL, ANATEL e ANP.

Mesmo sendo possível a simples reedição da Resolução Conjunta nº. 02/2001 e, portanto, a reconstituição da Comissão nos mesmos moldes anteriormente estabelecidos, acredita-se que a Consulta Pública poderá contribuir na busca por uma maior eficiência na atuação do colegiado e, consequentemente, para uma redução da judicialização dessas demandas.

A equipe de Direito Público continuará acompanhando as contribuições apresentadas no âmbito da Consulta Pública e permanece à disposição para eventuais esclarecimentos adicionais.

Thiago Cardoso Araújo, advogado  (taraujo@bocater.com.br)

Ana Carolina Alhadas Valadares, estagiária (avaladares@bocater.com.br)

1 Resolução Conjunta nº. 02/2001 – “Aprova o Regulamento Conjunto de Resolução de Conflitos das Agências Reguladores dos Setores de Energia Elétrica, Telecomunicações e Petróleo”.

2 Resolução Conjunta nº. 01/1999 – “Aprova o Regulamento Conjunto para Compartilhamento de Infraestrutura entre os Setores de Energia Elétrica, Telecomunicações e Petróleo”.

3 Art. 27. “Instruído o processo, nos termos do presente Regulamento, a Comissão notificará as partes para apresentarem alegações finais, no prazo de cinco dias, ou as intimará para participarem de audiência, objetivando a conciliação dos interesses”.

4 Art. 33. “Feitas as alegações finais ou decorrido o prazo para sua apresentação, a Comissão proferirá sua decisão final no prazo de até vinte dias, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada”.

5 Art. 36. “A decisão da Comissão terá efeito vinculante para as partes e seus representantes, dela não cabendo nenhum recurso na esfera administrativa”.

6 Decreto nº. 9.759 de 2019 – “Extingue e estabelece diretrizes, regras e limitações para colegiados da administração pública federal”.

7 Art. 3º “Os colegiados que abranjam mais de um órgão, entidades vinculadas a órgãos distintos ou entidade e órgão ao qual a entidade não se vincula serão criados por decreto”.

8 Lei nº. 13.848 de 2019 – “Dispõe sobre a gestão, a organização, o processo decisório e o controle social das agências reguladoras (…)”.

9 Art. 29. “No exercício de suas competências definidas em lei, duas ou mais agências reguladoras poderão editar atos normativos conjuntos dispondo sobre matéria cuja disciplina envolva agentes econômicos sujeitos a mais de uma regulação setorial”.

10 § 2º  “Os atos normativos conjuntos deverão conter regras sobre a fiscalização de sua execução e prever mecanismos de solução de controvérsias decorrentes de sua aplicação, podendo admitir solução mediante mediação, nos termos da Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015 (Lei da Mediação), ou mediante arbitragem por comissão integrada, entre outros, por representantes de todas as agências reguladoras envolvidas”.

Autores

Thiago Cardoso Araújo e Ana Carolina Alhadas Valadares

Área de atuação

infraestrutura e Regulação

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