O Tribunal de Contas da União (TCU), recentemente1, não atendeu a um pedido da Petrobras para considerar a possibilidade de submeter à solução consensual as discussões em torno de contrato de tolling, ou industrialização por encomenda (uma modalidade de acordo que se utiliza da infraestrutura e know-how de empresas já estabelecidas) celebrado com a Unigel.
Com prazo de vigência de oito meses e avaliado em R$ 759,2 milhões, a tentativa de submissão do caso à SecexConsenso objetivava retomar as operações das Fábricas de Fertilizantes Nitrogenados (FAFENs) arrendadas à Petrobras, analisadas pelo Tribunal no âmbito de um processo de Tomada de Contas2.
O contexto que levou a estatal a esse pleito teve origem na análise da unidade técnica da Corte de Contas, que, ao apreciar o Contrato de Industrialização por Encomenda, destacou a ausência de assinatura de instâncias superiores no instrumento, falhas nas justificativas para o negócio e a assunção de riscos em um mercado desfavorável. Os técnicos concluíram, ainda, que o contrato teria sido uma solução provisória diante de alternativas mais duradouras, desrespeitando os princípios de eficiência, economicidade e razoabilidade.
Não fosse o bastante, se constatou que os cálculos de risco do tolling estavam equivocados e que outras opções consideradas pela Petrobras não teriam impactos relevantes. Optar pelo tolling, de acordo com o TCU, significava enfrentar a necessidade de reavaliar e talvez prorrogar indefinidamente o contrato após os seus oito meses de vigência, potencialmente causando danos maiores que as alternativas definitivas. Segundo apurado, a Petrobras assumiu um ônus deficitário de R$ 478,1 milhões, responsabilizando-se pela comercialização dos fertilizantes produzidos pela Unigel.
Com base nesses indícios, a unidade técnica do Tribunal considerou ser necessária uma medida cautelar para evitar a ativação do contrato de tolling ou suspender sua eficácia até que fossem esclarecidas as irregularidades apontadas.
O ministro Zymler, relator, contudo, julgou necessário esclarecer as questões de fato antes de deliberar sobre a proposta e devolveu os autos à unidade técnica para pronunciamento da Petrobras sobre as questões a serem elucidadas. A proposta foi reiterada pela unidade técnica após conclusão de que as irregularidades permaneciam.
Foi nesse contexto que a Petrobras solicitou que o relator analisasse “a oportunidade e conveniência de uma solução consensual“, destacando a longa fase instrutiva do processo e a urgência das questões levantadas, bem como a impossibilidade de o pedido ser endereçado pela própria estatal, conforme o art. 2º da Instrução Normativa TCU 91/20223.
O relator, ao não exercer a sua prerrogativa de formular o pedido de solução consensual, impediu a tentativa da Petrobras de evitar a suspensão do contrato. Como uma alternativa, sugeriu que a companhia buscasse a emissão desta solicitação por meio do Ministério de Minas e Energia.
No dia 28 de junho, a empresa anunciou a suspensão do contrato antes de produzir seus efeitos e, com isso, interrompeu sua estratégia de se reposicionar no segmento de fertilizantes, apesar de ter reafirmado o seu compromisso em continuar buscando soluções para o suprimento destas substâncias no país.
A decisão da Petrobras de suspender o contrato de tolling antes de sua ativação demonstra o impacto das decisões do TCU sobre suas estratégias. Este caso destaca a importância crescente da abordagem consensual no direito público, ainda que sua aplicação possa enfrentar obstáculos significativos em contextos complexos.
A equipe de Direito Público do Bocater Advogados continuará acompanhando a temática e está à disposição para mais esclarecimentos sobre o assunto.
1- A decisão foi tomada em 15 de maio deste ano, por Despacho proferido no âmbito do Processo 001.443/2024-0.
2- A Petrobras havia arrendado em 2019 as FAFENs de Camaçari/BA e Laranjeiras/SE para a Proquigel por um período inicial de 10 anos. Após um processo de ramp-up promovido pela Unigel e um contrato de fornecimento de gás natural com a Petrobras, a produção foi retomada. No entanto, em maio de 2023, a produção foi interrompida devido ao cenário desfavorável do Grupo Unigel. Em resposta, o Conselho de Administração da Petrobras revisou o Plano Estratégico 2024-2028, incluindo a produção de fertilizantes e produtos petroquímicos como parte de suas operações. Após negociações, foi mantido o arrendamento das FAFENs e contratada a Unigel para operar a produção de fertilizantes.
3- Art. 2º A solicitação de solução consensual de que trata esta IN poderá ser formulada: I – pelas autoridades elencadas no art. 264 do Regimento Interno do TCU; II – pelos dirigentes máximos das agências reguladoras definidas no art. 2º da Lei nº 13.848, de 25 de junho de 2019; e III – por relator de processo em tramitação no TCU.