Boletim Bocater

Terceira Turma do STJ: cabe ação autônoma de exibição de documentos no CPC

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No recurso especial nº 1803251, cujo acórdão foi publicado em 8 de novembro de 2019, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, a partir da vigência do Código de Processo Civil (CPC) de 2015, é possível ajuizamento de ação autônoma de exibição de documentos pelo procedimento comum.

Era costume, na sistemática do CPC anterior, a distribuição da chamada “ação cautelar de exibição de documentos”, que embora servisse de forma preparatória para uma ação principal, teve a sua natureza autônoma reconhecida pela jurisprudência da Corte [1]. Firmou-se o entendimento de que era possível o objeto da demanda exibitória se esgotar com o próprio documento, retirando-lhe a natureza cautelar (de conservação de direitos).

Havia, ainda, com base no antigo CPC, a possibilidade de requerer a exibição de documentos nos autos do processo já em tramitação. Ao contrário da ação autônoma, nesse caso a pretensão estava vinculada à pertinência com a demanda em curso.

A controvérsia surgiu a partir das mudanças trazidas pelo novo texto. O CPC atual, embora ainda preveja a exibição incidental de forma semelhante ao antigo, suprimiu a integralidade dos capítulos referentes às ações cautelares, existentes no código de 1973, e criou o chamado procedimento de “Produção Antecipada de Provas”.

A partir de então, alguns magistrados passaram a indeferir petições iniciais de ações autônomas de exibição de documentos, por entenderem que tal procedimento não estava previsto no CPC de 2015, que somente aceitaria a exibição incidental de documentos ou o “Produção Antecipada de Provas”. De certa forma, entendeu-se que o novo procedimento teria “substituído” a ação cautelar de exibição de documentos.

O problema do uso obrigatório de tal procedimento são as hipóteses em que ele se enquadra. O art. 381 do CPC de 2015 só permite a produção antecipada nas hipóteses de (i) fundado receio de perecimento da prova; (ii) a prova a ser produzida poder viabilizar autocomposição; (iii) a prévia produção da prova poder justificar ou evitar o ajuizamento da ação principal. Além disso, a premissa utilizada é a de necessidade de produção de uma prova, ao tempo em que na exibição de documentos se pretende a exibição de uma prova que já existe.

A sutileza está em se perceber que a Produção Antecipada de Prova vincula a pretensão de se produzir aquela prova – não necessariamente documental – à existência de uma outra pretensão, que poderá gerar (ou não) uma outra ação judicial. Ou seja, pretende-se utilizar aquele documento como meio de prova de uma pretensão futura de resolução de um conflito. Em outras palavras, a obtenção da prova servirá para a parte decidir se irá entrar com ação judicial ou se tentará resolver o conflito por algum meio alternativo.

Por outro lado, há casos em que o autor da ação de exibição pode pretender a trazer ao processo um documento que não irá servir como meio de prova de uma outra pretensão, mas simplesmente pleitear o direito a ter acesso ao documento.

É o caso, por exemplo, da pessoa que necessita comprovar a aprovação em determinado concurso e a instituição organizadora se recusa a entregar o certificado de aprovação. Assim, entra com a ação de exibição de documentos autônoma visando a simples obtenção do documento, não porque pretende utilizá-lo como meio de prova para outra ação judicial, mas sim porque tem o direito a obtê-lo.

Foi para proteger tal tipo de demanda que a Terceira Turma do STJ decidiu que cabe ação autônoma de exibição de documentos, a ser processada pelo procedimento comum e de caráter satisfativo, esgotando seu objeto com a obtenção da documentação pretendida.

O STJ foi bastante preciso ao delimitar que o procedimento poderá utilizar, no que aplicável, as disposições relativas à exibição incidental de documento ou coisa (art. 396 do CPC atual), notadamente no que se refere aos requisitos do pedido.

O efeito prático de tal medida será o aumento da quantidade de ações de exibição de documentos, como eram praticadas na vigência do CPC de 1973, restringindo o objeto do procedimento de Produção Antecipada de Provas àquelas provas que efetivamente precisem ser produzidas de forma antecipada e que estejam vinculadas a uma eventual demanda posterior.

Com isso, acredita-se que esse precedente poderá contribuir para a resolução definitiva de tal controvérsia, que tem gerado diversos posicionamentos contraditórios nas instâncias ordinárias.

Bruno Carriello, sócio (bcarriello@bocater.com.br)
Germano Costa, advogado (gcosta@bocater.com.br)
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[1] AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CAUTELAR DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS. INTERESSE NA INTERPOSIÇÃO DA AÇÃO PRINCIPAL.
NATUREZA AUTÔNOMA. AGRAVO IMPROVIDO.
1. A ação cautelar de exibição de documentos, em razão da pretensão que veicula, possui natureza autônoma, tendo em vista que, com a exibição dos documentos pretendidos, o promovente tem por satisfeito o objetivo buscado com a propositura da ação.
2. “Exibidos os documentos, pode haver o desinteresse da parte em interpor o feito principal, por constatar que não porta o direito que antes suspeitava ostentar” (REsp 244.517/RN, Relator o Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, DJ de 19/9/2005) 3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no AREsp 623.891/RJ, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 12/05/2015, DJe 11/06/2015)

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