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Tratamento tributário sobre a variação cambial de investimento no exterior por instituições financeiras

No último dia 28 de julho, a Medida Provisória 930/20 foi convertida na Lei 14.031 que, dentre outros dispositivos, traz em seus arts. 1º e 2º medidas que visam eliminar um problema há muito enfrentado por instituições financeiras, mas não apenas por elas.

As instituições financeiras (e outras componentes do sistema financeiro nacional) costumam ter dependências no exterior como parte importante de suas atividades operacionais, com vistas não apenas a expansão de suas atividades transfronteiriças, mas, principalmente, para melhor atender às necessidades do próprio mercado brasileiro e/ou de brasileiros no exterior. Em um cenário internacional favorável, essas dependências no exterior são utilizadas para captar recursos a custo mais baixo do que o custo dos recursos disponíveis no mercado doméstico.

Para não correr o risco das variações cambiais desses investimentos (em moeda estrangeira), as instituições financeiras costumam contratar operações de proteção (derivativos com finalidade de hedge) que sejam capazes de manter o valor dos investimentos em Reais, anulando ganhos ou perdas decorrentes da valorização ou desvalorização da moeda brasileira frente à moeda estrangeira, conforme ilustração abaixo:

Ocorre que, do ponto de vista tributário, até então, as variações cambiais dos investimentos, parte inseparável do resultado de Equivalência Patrimonial, eram neutras, ou seja, não afetavam as bases de cálculo do IRPJ, CSLL, PIS e COFINS. Por outro lado, os resultados das operações de proteção, sempre foram considerados resultados financeiros, portanto, receitas ou despesas próprias da atividade das instituições e por isso tributados para todas as finalidades (IRPJ, CSLL, PIS e COFINS), o que exigia que as instituições calculassem as operações de proteção considerando o “gross up” dos efeitos tributários, o que é conhecido pelo jargão “overhedge”.

Nesse cenário, a contratação das operações de proteção acabava se tornando mais cara e a efetividade do hedge era mais desafiadora.

A MP 930/20, atualmente convertida na Lei 14.031 veio com o objetivo de eliminar essa distorção, como informa a Exposição de Motivos:

As medidas contidas na proposta buscam, em especial: i) diminuir as distorções resultantes da assimetria de tratamento tributário entre as variações cambiais dos investimentos realizados por instituições financeiras e demais instituições supervisionadas pelo BCB em sociedade controlada estabelecida no exterior e sua respectiva proteção cambial.

O reconhecimento da distorção no tratamento tributário é uma novidade positiva e relevante. A forma de resolvê-la, no entanto, gera bastante dúvidas, a começar pelo fato de a Lei 14.031 não fazer qualquer referência a PIS e COFINS o que enseja a conclusão de que a questão do overhedge não terá os efeitos integralmente eliminados.

Em relação ao IRPJ e a CSLL, de acordo com a Exposição de Motivos, a proposta seria igualar a tributação sobre a variação cambial da parcela do valor do investimento coberta pelo hedge, com o da “variação cambial do respectivo hedge, eliminando assim a necessidade de proteção excedente ao valor do investimento”. A proposta seria de uma implementação escalonada, iniciando no exercício de 2021, na proporção de 50%, e passando para 100% no exercício de 2022.

Importante salientar que o próprio texto legal informa (art.1º) que a lei irá dispor sobre o tratamento tributário incidente sobre a variação cambial do valor de investimento. No art. 2º, no entanto, a lei trata da variação cambial da parcela com cobertura de risco (hedge), dispondo que está deverá ser computada na determinação do lucro real e na base de cálculo da CSLL.

Porém, os resultados das operações de proteção sempre foram computados. O que não era computado, até então, era a variação do valor do próprio investimento em função da variação cambial (tratado como parte do Método da Equivalência Patrimonial – MEP). Logo, é possível depreender que a intenção do legislador de igualar, em 2022, o tratamento das variações cambiais decorrentes dos investimentos e os resultados das operações de proteção correspondentes, na prática, está resultando na tributação da variação cambial dos investimentos no exterior, como se ilustra abaixo:

É certo que a redação desses dispositivos, que poderia ter sido aprimorada durante o processo de tramitação da MP 930/20 no Congresso Nacional, não permite que sejam alcançados todos os detalhes necessários à sua aplicação com a segurança jurídica desejável, logo, é importante que sejam emitidos normativos infralegais que confirmem a forma de operacionalizar o disposto nos referidos artigos da Lei 14.031/20 e que minimizem a possibilidade de contencioso associado ao tema.

Nossa equipe tributária está acompanhando de perto possíveis novos posicionamentos sobre o tema e permanece à disposição dos nossos clientes em caso de eventuais dúvidas ou esclarecimentos adicionais.

Luciana I. Lira Aguiar, sócia (laguiar@bocater.com.br)

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Luciana I. Lira Aguiar

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TRibutário

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