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Conselho Monetário Nacional regulamenta Sandbox Regulatório

O Conselho Monetário Nacional (CMN) editou, em 26 de outubro de 2020, a Resolução CMN nº 4.865, que estabelece as diretrizes, orientações e condições para o funcionamento do Sandbox Regulatório, com entrada em vigor prevista para o próximo dia 1º de dezembro.

O Sandbox Regulatório é uma iniciativa que se destina ao desenvolvimento de projetos inovadores, que consistem em produtos ou serviços experimentais relacionados ao Sistema Financeiro Nacional ou ao Sistema de Pagamentos Brasileiro, que se encontrem sob a competência do CMN e do Banco Central do Brasil (Bacen).

O objetivo primordial do Sandbox Regulatório é permitir que as entidades autorizadas a funcionar pelo Bacen possam realizar testes, por período determinado, de projetos nas áreas financeiras ou de pagamento, observadas as disposições regulamentares que viabilizam o desenvolvimento controlado e delimitado das suas atividades.

Para que o projeto seja considerado inovador, ele deverá (i) empregar inovação tecnológica ou promover o uso de tecnologia alternativa existente; e (ii) incorporar aprimoramentos, tais como o aumento de eficiência, segurança, ou a redução de custos. Para que uma entidade possa ser participante do programa, é preciso se enquadrar em alguma das seguintes categorias: (a) pessoa jurídica de direito privado; (b) prestadores de serviços notariais ou de registro; e (c) empresas públicas e/ou sociedades de economia mista.

Quando a entidade participante for instituição autorizada a funcionar pelo Bacen, este, a seu critério, poderá exigir a constituição de sociedade empresária para a realização do projeto.

As entidades interessadas em participar do Sandbox Regulatório deverão realizar a sua inscrição, conforme ato de convocação do Bacen, apresentando (i) proposta de fornecimento de produto ou serviço considerado projeto inovador e sob a competência regulatória do CMN; (ii) demonstração da origem dos recursos utilizados ou em vias de utilização para o projeto; (iii) comprovação de que seus administradores e controladores possuem reputação ilibada; (iv) plano de descontinuidade das atividades, a ser apreciado pelo Bacen e (v) designação de diretor estatutário, diretor mencionado no contrato social ou responsável legal pela participação da entidade no Sandbox Regulatório e pelo cumprimento das normas da Resolução CMN nº 4.865/20.

Conforme determinado no art. 4º da Resolução CMN nº 4.865/20, a operacionalização do Sandbox Regulatório ocorrerá por meio de ciclos, cuja duração será estipulada pelo Bacen, devendo ser limitada a um ano, prorrogável uma única vez por igual período. Entretanto, a critério do Bacen, poderá ser concedida a prorrogação, por até um ano, da autorização concedida ao participante do Sandbox Regulatório, caso (i) exista a finalidade específica de editar regulamentação para o produto ou o serviço ofertado pelo participante; ou (ii) tenha como objetivo iniciar o processo de autorização definitiva do participante.

Por ser uma iniciativa alternativa, a regulamentação e a condução do Sandbox Regulatório tem como pontos centrais (i) encorajar novas tecnologias e a diversidade de modelos de negócio no nosso Sistema Financeiro Nacional e de Pagamentos Brasileiro; (ii) buscar o aumento da eficiência e a redução dos custos inerentes ao Sistema Financeiro Nacional e ao Sistema de Pagamentos Brasileiro; (iii) desenvolver a concorrência e promover a inclusão financeira; (iv) aprimorar o atendimento às necessidades dos usuários finais, assegurando a liberdade de escolha, o aumento da segurança, a tutela dos interesses econômicos dos usuários, a ampliação da transparência na prestação de serviços e na cobrança de tarifas, a busca pelo tratamento não discriminatório, o aumento de privacidade, de proteção aos dados pessoais e do sigilo bancário, e a facilitação de acesso à informações claras, completas e às condições de fornecimento dos produtos e serviços, aumentando a sua confiabilidade e segurança;  e (vi) aperfeiçoar a regulamentação de matérias sob competência do CMN, do Bacen e, em relação a este último, dos seus processos de supervisão.

Os participantes do Sandbox Regulatório ficam sujeitos à observância das normas da regulamentação específica sobre o tema e, também, das regras sobre prevenção à lavagem de dinheiro e de combate ao financiamento do terrorismo, além das normas expedidas pelo Bacen sobre atendimento e reclamações de clientes.

Além disso, são deveres complementares dos participantes do Sandbox Regulatório os previstos no art. 8º da Resolução, e, dentre eles, merecem especial atenção: (i) a necessidade de adoção de controles e procedimentos destinados à identificação dos usuários e da autenticidade das informações; (ii) a prestação de informações sobre o conceito do Sandbox Regulatório; (iii) a informação, de modo claro, da natureza e complexidade dos produtos e serviços disponibilizados; (iv) a certificação acerca da adequação dos produtos às necessidades dos usuários, seus interesses e objetivos; (v) o zelo para que as operações sejam conduzidas com integridade, confiabilidade, segurança e sigilo; e (v) o fornecimento tempestivo de recibos, extratos e comprovantes relacionados aos produtos e serviços.

Em relação ao regime informacional, destaca-se o dever de divulgação de informações claras, objetivas e legíveis no site, aplicativo ou em outros meios de comunicação em rede, empregados pelo participante, incluindo materiais de propagandas, publicidade e contratos, permitindo a plena compreensão dos riscos e o caráter temporário do programa. É necessário também, que tais meios de divulgação contenham alerta sobre os riscos do projeto e advertência informando que as atividades são efetuadas no âmbito do Sandbox Regulatório, sem a autorização definitiva do Bacen, com data de término para a finalização da experiência pelo participante e de que o mesmo poderá modificar o projeto, mediante prévia anuência do Bacen.

Quanto às exigências de controle de riscos, constitui dever do participante implementar estrutura destinada ao gerenciamento de riscos que permita a identificação, mensuração, avaliação, monitoramento, reporte, controle e mitigação dos riscos operacionais, de crédito (se o projeto implicar captação de recursos junto ao público) e quaisquer outros riscos aos quais o participante esteja sujeito, bem como adotar políticas, estratégias e procedimentos que se destinem à dar efetividade aos controles previstos na norma.

Cabe ao participante indicar perante o Bacen um representante para acompanhamento rotineiro, apresentação de informações sobre o projeto, informações ou outros documentos solicitados e notificar sobre ocorrências de riscos extraordinários.

Considerando as características do projeto autorizado a participar, o Bacen, conforme art. 20 da Resolução, definirá o prazo para que o participante coloque seu projeto inovador em operação.

Durante o período de duração do Sandbox Regulatório, conforme art. 21 do normativo, caberá ao Bacen: (i) estabelecer limites operacionais, ou ajustá-los, quando a atividade do participante possa expor a riscos excessivos: (i) o Sistema Financeiro Nacional; (ii) o Sistema de Pagamentos Brasileiro; (iii) as suas partes relacionadas (nos termos do Plano Contábil das Instituições do Sistema Financeiro Nacional – Cosif); ou (iv) os seus clientes e usuários. Em caso de inadequação ou insuficiência no controle de riscos, poderá determinar o seu aperfeiçoamento (art. 22), podendo ser adotados procedimentos simplificados de acompanhamento, conforme a complexidade e os riscos associados ao projeto inovador de cada participante (art. 23) .

Conforme o caso, o Bacen poderá condicionar a autorização para participar do Sandbox Regulatório ao cumprimento de limites operacionais e critérios adicionais destinados à mitigação de riscos, de forma personalizada para cada projeto, levando em consideração: (i) o interesse público, (ii) a proteção da poupança popular; (iii) os riscos do projeto, (iv) os riscos relacionados à lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo, e (v) a proporcionalidade (art. 34 e §§).

Finalmente, por ser um projeto com caráter temporário, o encerramento do Sandbox Regulatório poderá ocorrer: (i) por decurso do prazo; (ii) por obtenção de autorização definitiva, expedida pelo Bacen, ou (iii) por cancelamento de ofício, pelo Bacen ou a requerimento do participante.

Com a edição da Resolução, o Bacen evidencia o seu alinhamento às tendências internacionais, estimulando o empreendedorismo e o desenvolvimento do sistema financeiro e do sistema de pagamentos no Brasil.

Luiza Rangel de Moraes, sócia (lrangel@bocater.com.br)
Beatriz Gonçalves de Lucena, advogada (blucena@bocater.com.br)

Autores

Luiza Rangel de Moraes e Beatriz Gonçalves de Lucena

Área de atuação

Mercado de Capitais

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